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Usina da Dança

Equipes do IORM participam de laboratório para desenvolvimento do Processo Artístico do Espetáculo 2019

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No dia 26 de abril, aconteceu no IORM Orlândia o encontro com toda a equipe artística e psicossocial da Usina da Dança para o desenvolvimento de mais um laboratório prático de formação para o espetáculo deste ano, cujo tema será inspirado na história de Pinóquio.

Iniciado no período matutino, houve uma roda de conversa e discussão sobre o histórico de desenvolvimento que vem sendo construído ao longo de cinco anos no IORM, o qual prioriza-se o pensar e refletir antes da prática, que valoriza o aprofundamento das pesquisas e o aluno se sentir parte deste processo.  A escolha do tema Pinóquio veio pontuando uma reflexão sobre o ser humano, a construção de sua personalidade, valores, identidade e como os erros e acertos contribuem para essa construção. Os conteúdos propostos serão a base para o trabalho que logo será começado com as crianças e expandido para diversos ramos e interpretações diferentes.

Como suporte teórico dessa grandiosa pesquisa utilizamos a linguagem artística que permeou o processo, o Neoconcretismo, alinhado aos ideais da Usina da Dança de propor uma arte mais próxima do público. Durante o Pós-modernismo, na década de 50, o Neoconcretismo veio como uma quebra da racionalidade exacerbada que pregava as correntes artísticas anteriores, dando abertura para a subjetividade e diversas interpretações sobre um mesmo tema. Aliado à chamada Arte Propositora, que emergia na mesma época com o que hoje são grandes nomes do mundo das artes (Ernesto Neto e Lygia Clark), começaram a promover uma interação que permite aos espectadores se sentirem parte do que veem e sentem, sendo, sobretudo, compositores da obra e não meros observadores. Da mesma forma, objetiva-se toda essa integração nos processos artísticos do IORM, interessado em gerar através de sua arte o protagonismo, que as pessoas reconheçam o que veem como um lugar de encontro e relação. Que a arte seja instrumento para passar uma mensagem, gerar reflexões e não apenas encantar os olhos.

Foi utilizado também como fonte de pesquisa o texto escrito por Rubem Alves, que traz uma reflexão ao contrário, o menino de verdade que se transforma em boneco de madeira. O autor traz uma crítica sobre uma educação que não considera o potencial e as capacidades individuais e criativas das crianças, uma educação que tenta enquadra-las em um sistema educacional rígido e que valoriza apenas a razão, deixando a emoção de lado. O conto é assim apresentado “às avessas” para provocar uma reflexão que incentive mudanças significativas em favor de uma educação verdadeira, que preserve na criança – no ser humano – a capacidade de sonhar, de criar, de transformar e de se realizar.

Posteriormente, todos passaram por um momento de reflexão individual frente ao espelho se enxergando refletido, cada um em mãos de um objeto de significado pessoal, trazido de casa, com o intuito de resgatar valores, memórias afetivas, pensar na posição ocupada por cada um nesta realidade atual e sensibilizar a ação de reflexão em um ato de concentração sobre si próprio, de se silenciar e se ouvir em uma realidade tão atribulada. Algumas perguntas foram feitas durante esse processo: “O que está sendo refletido?”; “O que esse objeto significa para mim?”; “O que minha expressão diz?”; “Meu corpo mostra o que sinto?”; “Quem sou eu?”; “Como descrever minha identidade?”, “Quais os meus valores?”, “O que tenho construído em mim e gostaria de passar para meus alunos?”

Após esse momento individual, grupos foram formados de acordo com as cidades polos do IORM, Orlândia, Guaíra, Miguelópolis e Ipuã. A reflexão foi compartilhada, chegando-se a definição de algumas palavras chaves que identificariam os valores, bom hábitos e características a serem despertados nos alunos. Se identificando a ação do Gepeto na história do Pinóquio, os grupos fizeram um projeto de construção de um boneco que deveria ter materializado em si as palavras escolhidas.

Durante o período vespertino, aconteceu a confecção dos bonecos com diversos materiais que representaram significados próprios a cada grupo separados por cidade. De acordo com as características particulares de cada integrante, o boneco deveria revelar a figura do aluno protagonista, sendo materializado pelos próprios professores que, providos desses valores, refletem em seus aprendizes, aprendem também com os mesmos e não são os únicos detentores do saber. Sensibilidade, respeito, confiança e disciplina foram algumas das características tratadas.

O gerente executivo do IORM, Rafael Braghiroli participou do laboratório e  atestou a importância da introspecção, da persistência e da amabilidade dentro de todo processo de trabalho. Palavras como Revolução e Consciência foram chave para o sucesso do laboratório.

Todo o processo de elaboração do boneco foi baseado em quatro questionamentos que deveriam ser respondidos e materializados posteriormente: “Quais valores precisamos refletir em nossos alunos?”; “Onde está a poética neste boneco? Há interação auditiva, visual e/ou sinestésica?”; “Como enxergam o texto de Rubem Alves (sobre manipulação) nesta obra?”; “O que é ser boneco e ser criança de verdade?”.

 

O processo de criação do Boneco em Ipuã:

Para construção do boneco em Ipuã, o IORM realizou um processo conjunto de aprofundamento sobre as principais dificuldades trazidas pelas crianças e adolescentes participantes das Oficinas de Artes Integradas Usina da Dança neste ano de 2019. Um público, permeado por crianças e adolescentes inseridos em contextos extremamente vulneráveis, com grandes dificuldades de atenção, concentração, disciplina, comportamento e socialização, no desafio de despertá-los à sensibilidade, ao hábito de ouvir, a escuta atenta, ao dialogo respeitoso. Crianças e adolescentes que precisavam e precisam a todo tempo serem acolhidas, ouvidas e amadas, devido tamanha fragilidade existente em seus vínculos sociais.

Dessa forma, começamos a construir um boneco com características peculiares a chamar atenção. Escolhemos, portanto, o material (isopor) e aos poucos fomos dando forma ao corpo do boneco, ainda muito enrijecido devido o material escolhido propositalmente a fazer referência às suas dificuldades físicas, motoras e intelectuais.

Seu corpo foi perdendo a cor branca trazida pelo isopor e ganhando a tonalidade marrom escuro, permitida pelo uso da tinta guache. Já seus cabelos curtos e encaracolados, feitos de lã colorida, em tons vermelho, vinho, alaranjado, marrom, verde, azul faz contraponto as fortes características de personalidade trazida pelos participantes e reforça a questão da diversidade racial existente. Suas orelhas grandes tiveram o intuito de destacar a importância de ouvir atentamente. Sua boca pequena e em formato de coração, enfatiza a necessidade do falar menos e proferir palavras doces a partir de um dialogo sábio e acolhedor.

A forma articulada de suas pernas desperta o desejo de dançar, correr, brincar, e seus tocos de braços possibilitam o encaixe de braços humanos, sendo um convite ao abraço e ao afeto, reforçando a necessidade de acolhida, socialização, integração e fortalecimento de vínculos sociais, familiares e comunitários. Em seus pés, uma sapatilha de ponta na cor vermelha, objeto que faz referência ao esforço necessário para conquista do conhecimento, assim como, a cor vermelha veio reforçar a importância do amor em tudo que nos propomos a fazer. O fazer de coração, com o coração.

Suas roupas, por vez saia, vez bermuda, por vez camiseta, vez colant, com destaque as estampas do exército, refletem a força e a resiliência necessária mediante erros e acertos do decorrer da vida, em que ambos trarão aprendizado.  Obra menino, ora menina, ora humano, ora boneco, você pode ser tudo. Você pode ser simples, você pode ser o mundo. Pode ser o que você quiser.

“O Boneco que denominamos de Ipuana e Ipuano objetivou o romper com esteriótipos imagens, conceitos, ideias ou modelos pré-concebidas atribuídas às pessoas ou grupos sociais, muitas vezes de maneira preconceituosa. São impressões, preconceitos e rótulos criados de maneira generalizada e simplificada pelo senso comum. A quebra de padrões e as possibilidades de emancipação humana”, salienta a assistente social Letícia Gerim e toda equipe Ipuã em suas falas durante o encontro

 

O processo de criação do Boneco em Orlândia:

Em Orlândia, os educadores da Usina da Dança identificaram uma particularidade essencial das crianças: a atenção! Dessa forma, foram utilizadas antenas com fones de ouvida encaixados na cabeça do boneco, remetendo à curiosidade e esperteza do aluno receptor. Dentre os outros valores trabalhados, a sensibilidade foi representada pelo tecido de lã e espumas compondo as roupas e a pele do boneco, por ser um material maleável e aconchegante; a reflexão foi representada nos olhos feitos com cds, no sentido de ver além, buscar sempre mais, e também na boca formada por um pequeno espelho, lembrando do efeito de ação e reação, cuidado com as palavras para desenvolver o verdadeiro aluno protagonista; a sustentabilidade através das caixas de leite compondo os membros veio na capacidade que o aluno tem que desenvolver para se renovar; por último, as camadas de cabelo feitas com raízes, remeteu às nossas relações familiares e aos valores que aprendemos e que temos de trazer para os ambientes que frequentamos.

“Todo o grupo orlandino chegou à conclusão de que, dentro das aulas, deve haver uma troca de conhecimentos e não apenas a manipulação do professor para com o aluno, que se torna, dessa forma, apenas um boneco, entretanto é necessário sim seguir às regras e mediar atitudes, sabendo cada qual de sua posição como professores e alunos, levando em conta acima de tudo, à humanidade de cada um”, salienta a assistente social Laís Cunha e toda equipe Orlândia em suas falas durante o encontro.

 

O processo de criação do Boneco em Guaíra:

“Vou contar-lhes uma história como tudo aconteceu, eu estava num lugar bem longe em um depósito, espalhado pelos cantos aos pedaços e fui  transportado para  um grande salão de danças um lugar alegre porque tinha crianças .Eu sabia pois todos os dias esperava e espiava –as dançarem, uma musica suave tocava ao comando de alguém e a leveza de seus corpos elas rodopiavam como bailarinas. Ah!  Como eu vibrava e queria me juntar a elas poder participar daquela dança mágica e, muito especial para mim. Quando certo dia ensolarado e quente, ela surgiram acompanhadas por um monte de pessoas bonitas que eu, não conhecia. Todos sentaram em forma de um circulo falavam coisas que eu não entendia, depois ficaram todos em pé começaram a refletir e a falar de como eu deveria ser que estranho falarem de mim… Ah! Comecei a me sentir gente, um moleque ou uma menina não importava. O meu desejo era sair, conhecer outras pessoas, viajar, brincar, correr  enfim tudo o que uma criança desejaria fazer. Então começaram a minha criação, disseram que meu corpo poderia ser um espelho que, representaria minhas atitudes, minha imagem todos iriam se conhecer. Ah! Achei muito complicado porque os adultos fazem certas coisas que nós crianças não entendemos.

Meus braços seriam representados por garrafas transparentes. Minhas mãos gostei sabe, eram coloridas significam que eu estou aberto a receber qualquer pessoa, independente de qualquer característica e, pareciam arco íris para que todos pudessem me ver melhor. Minha cabeça sustentada por meu corpo ainda frágil, porque existe uma criança dentro de mim querendo despertar alegria e peraltice adorei meu cabelo todo macio e cheiroso, uma leveza sem fim. O chapéu era azul brilhante como as estrelinhas e a suavidade da imensidão do céu. Comecei a me transformar, mas o meu nariz ah! Este não me acostumou, como era flexível aceitei para sentir o aroma daquelas bailarinas que dançavam no salão. Minha boca foi uma tesoura, elas iriam representar meu crescimento, mas vou contar pra vocês, prefiro continuar a ser criança, para eu brincar, pular, correr e fazer minhas travessuras. Ah! Meus olhos brilhariam, era um encontro quando eu enxerguei de longe que realmente eu deveria ser.Ah!  Meu coração, sem ele como eu iria viver? A flor vermelha cravada no meu peito, vermelho é sangue é vida minha cor preferida. Eles medem a força do meu coração que passou a bater me dando vida para animar, acalmar num simples toque de mão. Minhas pernas eram firmes raízes de madeira e, me deram muita segurança agora vou poder andar viajar e sonhar. Eu estava pronto para enfrentar tudo e a todos, mas estava só, quando de repente surgiram outros bonecos que se juntaram a mim, mas seus nomes eu ainda não sabia… Começamos então a brincar, afinal, ganhei muitos amigos viajamos cada um ao seu destino. Hoje sou muito feliz, aos poucos juntando pedaços que foram transformados neste boneco, Além de Mim.”

A história foi criada por Theater Beth, mediante contribuições do assistente social Renan Quirino, a educadora Valesca Aguetoni Lima e toda equipe Guaíra em suas falas durante o encontro em suas falas durante o encontro.

 

O processo de criação do Boneco em Miguelópolis:

“Na construção do boneco, o corpo estruturado em uma caixa de papelão, representa responsabilidade, as crianças aprendem a cuidar de seus pertences. A resistência e a força foram representadas pelo suspensório, material forte. A alegria foi representada pela peruca colorida, feito com material de lã. E o amor foi representado pelo coração na camisa, demonstrando que para que ocorra o aprendizado, é preciso amor e dedicação no que se faz. O projeto transforma a vida delas e das pessoas no entorno, na convivência. A equipe de Miguelópolis Decidi pelo boneco humano para oportunizar a todas às alunas, a experiência de vestir o boneco e assim poder transformá-lo em um personagem com Vida e Sonhos. Um personagem João e Maria, representando os dois gêneros, enfatizando que o humano não se diferencia,  não se discrimina. A diferença é boa, acrescenta, soma… “ salientaram o educador Wellington Miranda, a professora de Dança Vivian Vinha, a pedagoga Aline Medeiros, e toda equipe Miguelópolis em suas falas durante o encontro em suas falas durante o encontro.

O encontro foi finalizado com a discussão dessas perguntas grupo a grupo guiados pela fala da coordenadora artística Valéria Pazeto, e a apresentação de cada um dos bonecos. “A importância da equipe como educadora e transmissora de valores para a geração futura que essas crianças comporão, foi muito bem exposta, revelando a forma como o caráter bem estruturado reflete as atitudes pessoais e coletivas, no cotidiano de cada um.”, afirmou Valéria.

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