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Agenda Cultural

PÉS QUE OUVEM E MÃOS QUE FALAM: Primeiro espetáculo virtual da Usina da Dança responde aos desafios dos tempos atuais com ternura e esperança

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Pela primeira vez em sua história, a Usina da Dança, produziu um espetáculo virtual: Pés que Ouvem, Mãos que Falam, adotando a linguagem da Videodança, que une cinema e dança. Ao todo, foram onze espetáculos realizados  pelo Instituto Oswaldo Ribeiro de Mendonça – IORM e pela Secretaria Especial de Cultura do Ministério do Turismo do  Governo Federal. O Espetáculo “Pés que Ouvem, Mãos que Falam” integra as ações previstas no Projeto Agenda Cultural 2020.

Pés que ouvem, mãos que falam, foi lançado dia 15 de dezembro, em um evento online promovido pelo IORM em parceria com a Universidade de Campinas – Unicamp. Os links foram disponibilizados nas redes sociais institucionais e Youtube.

Os espetáculos trazem apresentações dos alunos de todos os núcleos das Oficinas de Artes Usina da Dança realizadas pelo IORM nas cidades de Orlândia, Ipuã, Miguelópolis e Guaíra. Educadores participaram de formação para construção dos processos criativos em colaboração  com os profissionais da Unicamp _ Daniela Gatti, Diogo Angeli e Renata Paulino. A adaptação e desenvolvimento ficou a cargo da equipe dos artistas educadores que trabalharam em um processo de cocriação do espetáculo junto a cada turma em cada cidade que o Projeto Agenda Cultural 2020 é realizado.

Espetáculo e Pandemia

A criação do espetáculo partiu de um processo investigativo de escuta ativa dos participantes e adaptações. A pandemia de Covid-19, exigiu o distanciamento social e a interrupção das aulas presenciais nas Oficinas de Artes do os núcleos do IORM. A alternativa proposta pelo Instituto foi a criação de uma plataforma virtual que permitisse a transmissão de aulas on-line e a consolidação dos vínculos entre educadores e alunos, como pressuposto fundamental para o ensino aprendizagem.

Inicialmente, as atividades virtuais tiveram a adesão de cerca de 30% dos alunos. O IORM  criou estratégias para provocar o interesse e a participação ativa dos alunos, como visitas presenciais dos professores na casa dos alunos para auxílio nas filmagens,  composição das coreografias em vídeodança e o oferecimento de atividades diversificadas como lives e gincanas, levando em conta rígidos protocolos de segurança. As estratégias adotadas tiveram sucesso e a adesão aos conteúdos saltou para cerca de 90% do total de alunos matriculados no projeto.

Os momentos iniciais de construção do espetáculo ocorreram pela mediação fundamental da coordenação artística, representada por Valéria Pazeto, através de ações formativas em equipe.

Os temas Terra, Água, Ar e Fogo foram selecionados de acordo com as particularidades de cada turma da Usina da Dança. “O elemento terra foi representado pelo balé clássico, para turmas iniciantes um, por remeter à concretude do elemento e os aspectos mais técnicos da modalidade”, explica a coordenadora artística, Valeria Pazeto. “O elemento água foi representado artisticamente pelo jazz, para turmas iniciantes dois, pela fluidez ser uma característica correspondente aos movimentos do jazz e da água. Já o elemento ar encontrou sua expressão na dança contemporânea, para as turmas iniciantes três, por conter subjetividade e abstração e, por último, o elemento Fogo foi representado pelo jazz e balé clássico, pelas turmas mais avançadas, pela potência e energia”, como descreve Valeria.

Os pilares da Usina da Dança: a  Educação Somática, Arte e Educação, Teoria da Complexidade e a Intertransdisciplinariedade, foram unidos às relações entre professores e alunos, família e sociedade para um resgate sensível do cotidiano. “Nos embasamos na obra de Ghandy Priorsky, para valorização do processo da reflexão antes de ser efetuada a ação.”, conta.

“Percebemos a defasagem infantil em relação às questões básicas do desenvolvimento psicomotor e a influência da tecnologia na vida cotidiana. Nossa observação, escuta e interação com as crianças, suas famílias e a comunidade demonstrou um adoecimento dessas crianças por falta de atenção, de diálogo com os pais e amigos”,  relata.

A Usina da Dança buscou o equilíbrio entre natureza e digital. As questões evidenciadas pela equipe social, demonstraram agravamento durante a Pandemia. Por isso, trabalhar com um olhar de contato com o primitivo foi essencial para a prevenção da perda de noções psicomotoras básicas e também para a educação do sensível. “valorizar e explorar diferentes toques e sensações dentro do ambiente de nossas casas é essencial para não deixarmos perder as emoções tão propriamente humanas. Ouvir os sons da janela, fazer nossa sombra dançar sob o sol e sentir a terra cobrindo os pés permitem o desenvolvimento integral da sensibilidade, o que seria impossível apenas pela tela do celular. Desse modo, a arte vem como um refúgio de sanidade em tempos tão difíceis. São as linguagens não-verbais que demonstram o que, muitas vezes, palavras não conseguem expressar. É sorrir, chorar, sentir, sonhar, explorar através do movimento. E por acreditarmos na arte como área de conhecimento que compõe e valoriza a educação dos seres humanos, escolhemos e alinhamos esse tema aos ideais aqui desenvolvidos.”, destaca.

Linguagem 

A videodança pode ser definida como o dançar para a câmera. Não se trata, de  reproduzir um passo de frente para a tela do celular ou filmadora: as filmagens em dança envolvem muitos fatores e permitem um universo de possibilidades nas criações. “E nesse tempo que estamos vivendo, esse foi o caminho encontrado para mostrarmos que, mesmo diante da pausa existe movimento.”, salienta a coordenadora artística do IORM, Valeria Pazeto.

O meio eletrônico oferece uma nova forma de expor a obra e estabelecer uma nova relação dialética entre o autor e o espectador.

A inspiração para o título da oficina que deu início ao espetáculo foi a percepção de que os pés podem ter muitos significados: são apoio, a primeira articulação, a conexão com a terra, o enraizamento dentro da realidade de cada um… E as mãos dão vazão às expressões corporais, a gesticulação manual permite complementar o entendimento das emoções e sentimentos de quem fala para aquele que ouve e observa, de acordo com cada situação vivida.  Para iniciar a atividade, foi proposto a cada participante envolvido a retirada dos sapatos, a introdução de uma venda nos olhos e o auto massagear dos pés com os olhos vendados, enquanto a sonoridade de uma suave cantiga de roda preenchia o ambiente. Depois, cada pessoa individualmente deveria fazer o reconhecimento do local ao seu redor e dirigir-se ao lugar escolhido.

Cada um em seu lócus determinado, deveria atentar-se aos comandos dirigidos e, descalços com os olhos vendados, explorar o ambiente ao seu redor com as partes e o todo dos pés. Alguns estavam na grama ou na terra, outros próximos a árvores e outros ainda no chão de cimento, em diferentes possibilidades de experimentação.

Os alunos escreveram  as sensações vivenciadas pela dinâmica, refletindo-a e relacionando-a com os contextos e lembranças individuais.

Finalizada esta primeira parte, cada professor foi convidado a fazer a gravação do seu brincar com o espaço e os elementos da natureza, com movimentações baseadas na modalidade de dança aplicada por cada um, resultando em vídeos com  conteúdo profundo e sensível, que revelou as diversas possibilidades estéticas e poéticas do digital. Os movimentos individuais foram materializados em grupo.

Essa dinâmica foi primeiramente realizada com os professores, e depois com os alunos, em uma oportunidade de escutá-las e fazer se sentirem parte de todo o processo. “Nosso objetivo foi o de conseguir atingir a todos os assistidos, mas sem exigir perfeições coreográficas e prevenir possíveis lesões. Valorizamos da mesma forma o processo criativo e o resultado final”, afirma Valeria.

O espetáculo  foi adaptado da linguagem escrita para a linguagem de interpretação corporal, a partir de uma profunda observação do contexto socioeconômico, das raízes culturais regionais e da capacidade motora dos alunos são os itens que norteiam a adaptação. A adaptação observou as faixas etárias e respondeu ao desafio de transportar essas movimentações conscientes para vídeos curtos e objetivos, para facilitar a compreensão do aluno e sua resposta, através de gravações audiovisuais, construindo uma narrativa coerente, harmonizando os vídeos individuais, em uma único espetáculo.

O roteiro definiu ações, as etapas, os movimentos coreográficos, as edições das videodanças, primeiramente por cada professor com suas turmas e, posteriormente, da junção de todas as coreografias e as atividades que estiveram envolvidas durante o ano para que o desenvolvimento do espetáculo ocorresse, como resultado do aprendizado cotidiano da dança. O roteiro foi adaptado para todas as faixas etárias e permitiu que todos os envolvidos no projeto participassem durante o espetáculo virtual.

A planta tropical Peperômia-filodendro, foi o elo de ligação entre as videodanças de todas as turmas, promovendo a coesão ao resultado final. Professores de cada modalidade artística gravaram movimentações relacionadas ao elemento da natureza que coreografaram, representando a união dos elementos.

O clipe de encerramento do espetáculo virtual traz imagens de uma ponte, que denota a caminhada em busca da superação dos obstáculos e a ligação entre todos os integrantes do processo, todos essenciais para a concretização do projeto. “Utilizamos a imagem dos olhos de janelas, portas e os olhos das crianças, com significação de dentro e fora das nossas casas, do nosso corpo, mas ao mesmo tempo todos unidos pela ternura e a esperança fundamentais, que nos movem em tempos difíceis.”, finaliza Valeria.

 

Elaine Sekimura

O autor Elaine Sekimura

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